"Porque vós estais todos enlameados na rotina animal e não quereis saber senão da gamela a horas, da canga a horas, do trabalho servil, e nem sequer sabeis que existis. Todo o país está podre de estagnação, vós moveis um pé no lodaçal e ficais logo estoirados do esforço ao fim do dia. Mas nunca vos perguntais para quê, nunca vos perguntais o que isso quer dizer, nunca vos perguntais com que direito haveis de ser boi até ao fim da vida. Parai, ó estúpidos, suspendei um momento esse vosso trabalho animal e perguntai-vos se é essa a vossa vontade, se num instante da vossa tarefa cavalar é isso com que sonhais para vosso prazer. Porque é que não fazeis aquilo que quereis? Porque é que não ergueis o vosso berro de revolta? Não falo apenas dos que suam que se fartam por um bocado de pão. Não falo apenas dos que amocham como bestas por uma tigela de caldo. Falo mesmo dos tubarões do capital, banqueiros atolados em moedas que são fezes, o excremento da ganância e da vileza, grossos empresários que quereis empresariar o mundo, o céu com a vossa fumarada, as almas com as vossas cadeias e os rios e os peixes deles com a vossa matéria excrementícia. O que tenho a dizer-vos é se já vos perguntastes porque é que estais vivos, que é que fazeis da vida, porque é que amochais à vontade de outrem, porque é que alombais com um destino que não é o vosso."
Vergílio Ferreira
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